Foi na sexta-feira (26) o momento mais quente até agora da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga a gestão do governo federal frente à pandemia de Covid-19. Os irmãos Luís Claudio Miranda, deputado federal pelo DEM-DF, e Luís Ricardo Miranda, servidor concursado do Ministério da Saúde e responsável pelo departamento encarregado de importações da pasta, prestaram depoimento sobre suspeitas em torno do contrato do governo para a aquisição da vacina indiana Covaxin. As informações dos irmãos tratam também sobre a suposta omissão do presidente Jair Bolsonaro, que teria sido avisado por eles sobre as suspeitas.
No ponto mais contundente do depoimento, o deputado Luís Miranda confirmou, após resistir durante horas, que o chefe do Executivo teria afirmado que Ricardo Barros, deputado líder do governo na Câmara, estaria envolvido na situação. Ao revelar o nome de Barros, Miranda afirmou saber que vai sofrer represálias por conta de seu depoimento. “Vocês não sabem o que vou passar por apontar que o presidente da República, que todo mundo defende como uma pessoa correta e honesta, sabe que tem algo errado, sabe o nome, sabe quem é e não faz nada com medo da pressão que pode levar do outro lado. Que presidente é esse que tem medo da pressão de alguém que está fazendo algo errado, que desvia dinheiro público das pessoas que morreram com a p* desse covid”, disse, exaltado.
Houve mais revelações ao longo dos depoimentos, bastante conturbados devido às interrupções dos senadores governistas – que tentaram a todo custo desqualificar os irmãos Miranda. De acordo com os depoentes, as notas fiscais emitidas para a compra da Covaxin divergiam do contrato firmado com o Ministério em pelo menos três pontos. Primeiro, na quantidade de doses a serem entregues; depois, na exigência do pagamento antecipado de 45 milhões de dólares; e, por fim, na inclusão de uma empresa externa às negociações, em vez da fabricante indiana ou sua representante no Brasil (a Precisa Medicamentos.)
Segundo Luís Ricardo, do Ministério da Saúde, foi feita uma pressão “anormal” para que se autorizasse a importação da vacina, algo que ele não teria percebido em outros pedidos semelhantes. Ao perceber a incongruência nas informações, e suspeitando do envolvimento de seus superiores imediatos, o servidor teria pedido a ajuda do irmão deputado para intermediar uma reunião com Jair Bolsonaro, o que ocorreu em 20 de março. Na ocasião, ambos relatam ter entregado ao presidente documentos e informações sobre o caso. Disseram, também, que o chefe do Executivo teria dito que iria encaminhar a questão à Polícia Federal, o que não teria ocorrido, segundo os senadores.
De acordo com o vice-presidente do colegiado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), as provas coletadas até o momento são suficientes para que a Comissão encaminhe ao Supremo Tribunal Federal (STF) um inquérito contra o presidente. “Temos os elementos necessários de um crime de prevaricação. Vamos comunicar ao Supremo e, se for o caso, também ao procurador-geral da República”, disse.
Do outro lado, Osmar Terra
De um lado, os depoentes que falam contra o governo trazem provas robustas de ações e omissões que teriam sido importantes para questões-chave em torno da pandemia. De outro, aqueles que deveriam defender o trabalho do Executivo se enrolam em informações falsas. Depois de casos emblemáticos como da médica Nise Yamaguchi e da secretária de Gestão do Trabalho e da Educação em Saúde do Ministério da Saúde, Mayra Pinheiro (a capitã cloroquina), na última quarta-feira (22) quem depôs foi o deputado federal Osmar Terra, ex-ministro da Cidadania de Bolsonaro. Médico, ele seria participante do suposto “gabinete paralelo” que assessorava o presidente sobre a pandemia.
Terra citou dados falsos para defender os argumentos encampados pelos governistas contra o isolamento social. Usou o caso da Suécia como exemplo de país que teria obtido sucesso no enfrentamento à pandemia , mesmo sem lockdown – o que não é verdade, uma vez que o país também sofreu com UTIs lotadas e descontrole da doença no fim do ano passado. Para completar, Terra afirmou que “o isolamento aumenta o contágio dentro de casa”, contrariando o que recomendam organismos e profissionais da área de infectologia em todo o mundo. O Brasil já ultrapassou a casa dos 510 mil mortos por Covid-19.
Você precisa saber
Agrotóxicos, fome e soberania alimentar
O Brasil é atualmente o país onde mais se consome agrotóxicos em todo o mundo, muitos deles proibidos em outros países, como Alemanha e França. Somente em 2020, 493 novos pesticidas foram registrados e há, no Supremo Tribunal Federal, julgamento em curso para isentar os impostos destes produtos. Além de nocivos para a saúde humana quando consumidos por meio dos alimentos plantados em larga escala, os agrotóxicos atingem também cultivos orgânicos ao serem pulverizados de forma aérea.
O uso desses pesticidas tem o objetivo de aumentar a produção no campo, o que de fato ocorre. No entanto, esses números não se refletem na distribuição igualitária dos recursos entre a própria população do país: dados comprovam que cerca de 19 milhões de brasileiros estão passando fome, o que fere o que se conhece por soberania alimentar.
“O país, primeiro, precisa olhar pela saúde do seu povo, a saúde que entra pela boca. E, para isso, os alimentos têm de estar, de preferência, sobrando e serem de qualidade”, defende José Damasceno, membro da coordenação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra do Paraná. Leia mais na segunda matéria especial publicada no site da Rede Lado.
Casal homoafetivo garante na Justiça direito a reembolso-babá
A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) foi condenada pelo Tribunal Regional do Trabalho (TRT) a pagar o reembolso-babá a um funcionário que adotou uma criança juntamente com seu companheiro. O autor da ação teria solicitado por duas vezes a concessão do reembolso-babá aos Correios, tendo os pedidos negados.
O reembolso-babá é concedido às empregadas mães e aos pais solteiros, separados ou divorciados que detêm a guarda exclusiva dos filhos. A ECT diz que a extensão do benefício aos homens serve para auxiliar aqueles que cuidam sozinhos dos filhos, e este não seria o caso do reclamante.
No entanto, a juíza do Trabalho Margarete Dantas Pereira Duque, da 10ª vara do Trabalho de Brasília, considerou que o fato de a adoção da criança ter sido realizada por casal homoafetivo não pode levar à desigualdade quando da concessão do benefício ao empregado-pai e em prol da criança. A decisão do TRT vai na mesma direção. De acordo com o desembargador Grijalbo Fernandes Coutinho, a negativa da empresa promove distorção do princípio da isonomia.
“É preciso banir discriminações negativas condutoras de qualquer tipo de inferioridade ou preconceito, por outro, incrementar ações políticas dotadas de caráter diferenciado e protetivo para grupos da sociedade marcados por notórias condições de desigualdades intoleráveis entre seres humanos”, disse em seu voto. O desembargador completa que a Constituição garante proteção a todos os tipos de família, incluindo aquelas formadas por pessoas do mesmo sexo, e que é inadmissível o preconceito, em especial vindo de uma empresa pública Federal.
Análises
Os ideólogos são os outros – Ideologia de gênero e educação sexual
Por Raquel Jales Bartholo de Oliveira, do escritório LBS Advogados
A escola é um lugar de liberdade de pensamentos, um ambiente plural. Mas esse espaço para se debater ideias e costumes tem sido, cada vez mais, alvo de ataques por parte de conservadores. Para além do discurso, há propostas legislativas que se dizem contra o que chamam de “ideologia de gênero”. Entretanto, essas propostas “não cumprem o dever estatal de promover políticas públicas de inclusão e igualdade, contribuindo para a manutenção da discriminação”. Continue lendo.
Antes de sair…
Eventos
- Amanhã, dia 30/6, e quinta, 1º/7, a 1ª Conferência Internacional sobre Sustentabilidade e Diversidade Cultural da Amazônia Maranhense discute a importância e os potenciais da área sob uma ótica decolonialista. É das 9h às 17h, no YouTube.
- Na sexta, 2/7, o webinar “Além da reforma administrativa: O papel do Estado no século XXI” reúne pesquisadores do Brasil e de Portugal, a partir das 18h, para discutir o tema.
- E na próxima segunda, 5/7, tem o evento “Desafios da LGPD nos primeiros anos de sua vigência”, promovido pela OAB.
Dicas culturais
- Festival: a 10ª edição do MPBJazz vai de 1º a 3 de julho, sempre às 21h30, com atrações do gênero musical do Brasil e dos Estados Unidos.
- Websérie: as dançarinas Carol Mendes e Paola Vasconcelos são as protagonistas da websérie Enlace, que estreia amanhã, 30/6, às 18h. Em dez episódios, elas retratam questões íntimas, muitas vezes envolvendo cenas de abuso, e como a história das personagens uniu a dança urbana e o tango.
Sociedade Brasileira de Física elege mulher como presidente pela primeira vez em sua história
Em 55 anos desde sua fundação, a Sociedade Brasileira de Física, maior sociedade científica em número de sócios do país, terá pela primeira vez uma mulher eleita como presidente. A professora Débora Peres Menezes, do Departamento de Física da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), venceu o pleito no último dia 18, e tem posse agendada para 16 de julho.
Graduada em Física pela Universidade de São Paulo (USP) e doutora pela University of Oxford (Inglaterra), com outras formações em Portugal, Austrália e Espanha, a docente integra o Comitê Gestor do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) e a Comissão de Física Nuclear da International Union of Pure and Applied Physics.
Com um currículo amplo nas áreas de ensino e pesquisa, Menezes também se dedica à divulgação científica, por meio do canal do YouTube Mulheres na Ciência, que aborda questões científicas de forma simples, com filmes curtos produzidos e protagonizados por cientistas e estudantes mulheres. O objetivo é derrubar o estereótipo de que mulheres são menos competentes do que homens.