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Denúncia de propina derruba diretor do Ministério da Saúde

Depois do ruidoso depoimento dos irmãos Miranda na CPI que investiga a gestão federal frente à pandemia de Covid-19, a última semana foi marcada pela denúncia de pedido de propina por parte do governo para a aquisição de vacinas. De acordo com o jornal Folha de S. Paulo, e-mails provariam que o Ministério da Saúde teria negociado a aquisição de imunizantes da Davati Medical Supply e que um representante da empresa teria recebido proposta de propina: 1 dólar por dose negociada. O contrato era de 400 milhões de doses do imunizante da AstraZeneca. A proposta de propina teria vindo do diretor de logística da pasta, Roberto Ferreira Dias, exonerado no dia seguinte à publicação da reportagem.

A denúncia divulgada pelo jornal paulista teria partido do Policial Militar e suposto representante do laboratório Davati Medical Supply Luiz Paulo Dominguetti Pereira. Em uma negociação da vacina do laboratório AstraZeneca com o Ministério, ele teria sido alvo da tentativa de suborno por parte do diretor Dias durante um jantar no dia 25 de fevereiro. No entanto, a farmacêutica negou ter um intermediário no Brasil, assim como a Davati disse que o policial é um “vendedor autônomo” e que a empresa não tem convênio para comercialização do imunizante citado.

O histórico de Dominguetti não inspira lá muita confiança: o cabo da PM de Minas Gerais já cuidou da guarita do gabinete militar do governador Romeu Zema, foi exonerado do cargo depois de 15 meses por “não corresponder ao perfil necessário de atuação no setor” e responde a 37 processos na Justiça – um deles por dever quatro meses de aluguel; outro, por comprar um carro financiado em nome de uma mulher, não pagar as parcelas, levar multas que estão em nome da proprietária e ainda sumir com o veículo, até hoje não localizado. Ainda assim, graças à repercussão da matéria, ele foi convidado a depor aos parlamentares da CPI da Covid na última quinta-feira (1º).

No depoimento, o PM confirmou novamente o pedido de propina de Dias e envolveu o nome do deputado Luis Miranda nas supostas negociações. Disse que o parlamentar teria tentado comprar imunizantes diretamente com a Davati. Para provar as afirmações, apresentou um áudio que teria sido enviado a ele por Cristiano Alberto Carvalho, procurador da Davati no Brasil, em que o deputado supostamente tentava adquirir vacinas. O material foi rapidamente desacreditado pelo próprio Carvalho.

O depoimento de Dominguetti foi visto como uma tentativa do governo Bolsonaro de criar uma cortina de fumaça ao plantar uma testemunha que desacreditasse a versão apresentada na semana anterior pelos irmãos Miranda, e que implica diretamente o próprio chefe do Executivo. Devido ao falso testemunho do PM, senadores pediram a prisão de Domingetti, mas o presidente da CPI Omar Aziz recusou e, no lugar, pediu a apreensão do celular dele.

PGR recomenda investigação

Na obrigação de fazer algo a respeito das denúncias apresentadas pelos Miranda na semana anterior, a Procuradoria-Geral da República (PGR) primeiro enviou ao Supremo Tribunal Federal (STF) um parecer no qual recomenda a investigação sobre as negociações para a compra da vacina Covaxin. Era um sinal de que o órgão deve pegar leve com o presidente: o procurador Humberto Jacques de Medeiros tentou engavetar a suspeita de prevaricação que recai sobre Bolsonaro, e sugeriu que o trabalho já estaria sendo feito pela CPI.

No entanto, após um puxão de orelhas da ministra Rosa Weber, a PGR se viu na incumbência de fazer alguma coisa de fato. O órgão então pediu a abertura do inquérito, mas adiantando que há “ausência de indícios” que comprovem a culpa de Bolsonaro e que é preciso verificar o que realmente foi feito após o encontro entre o presidente e os irmãos denunciantes.

Você precisa saber

Ciro, Mandetta e Leite participam de debate como presidenciáveis

De olho nas Eleições de 2022, o Estadão e o Centro de Liderança Pública (CLP) realizaram na última quinta-feira (1º) um debate online entre três presidenciáveis: Ciro Gomes (PDT), Luiz Henrique Mandetta (DEM) e Eduardo Leite (PSDB). A primeira edição da série Primárias teve como temas a crise energética, o Sistema Único de Saúde (SUS), o desmatamento da Amazônia e o desenvolvimento.

Mandetta foi o primeiro a falar e defendeu a reforma tributária e a continuidade de programas sociais. “Vamos ter de fazer transferência de renda por um bom tempo porque as pessoas estão passando fome”, disse.

Já para Ciro Gomes, três providências seriam emergenciais no Brasil: ajudar famílias endividadas e empresas colapsadas, e elaborar um plano de crescimento para o país na ordem de 3 trilhões de reais em 10 anos. “O acúmulo desse genocídio, o desastre social e econômico e o desastre moral, afirmam claramente que estamos diante da pior crise de toda a nossa história”, afirmou.

Atual governador do Rio Grande do Sul, Leite afirmou ser fundamental que educação, meio ambiente e diversidade sejam prioridades. No mesmo dia, após o debate, Eduardo Leite assumiu-se gay pela primeira vez publicamente, durante entrevista ao apresentador Pedro Bial. A declaração foi apoiada por lideranças como o governador de São Paulo João Doria e adversários políticos como Manuela D’Ávila, mas foi questionada pelo atual presidente Jair Bolsonaro em conversa com simpatizantes na manhã de sexta-feira (2). “É o cartão de visita para a candidatura dele”, disse o presidente, famoso por declarações homofóbicas desde antes de sua eleição.

Queimadas na Amazônia batem recorde de 14 anos em junho

De acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) o mês passado teve 2.308 focos de calor registrados na Amazônia, um recorde de queimadas na região para o mês de junho desde 2007. O número é 2,6% maior do que o registrado no mesmo período do ano passado, que já havia sido um recorde histórico. E não é só a floresta que está sendo afetada: o Cerrado também teve 58% a mais de focos de incêndio em junho do que em maio deste ano.

Para o Greenpeace Brasil, os números se devem às mudanças climáticas, impulsionadas, entre outros fatores, pela própria queima de florestas e vegetações nativas. “A floresta e seus povos estão sendo atacados por todos os lados, seja pelos desmatadores, grileiros, madeireiros e garimpeiros que avançam sobre a floresta ou territórios, seja por meio do Congresso e do Poder Executivo que, não só não combatem esses crimes e danos ambientais, como os estimulam, seja por atos ou omissões”, disse Rômulo Batista, porta-voz da campanha de Amazônia da entidade.

Na semana passada, o governo federal publicou decreto que suspende por 120 dias o uso de fogo em atividades agropastoris e florestais, o que seria insuficiente para coibir a prática, pois o mesmo decreto foi publicado em 2020 e os focos de incêndio aumentaram mesmo assim, segundo o Greenpeace.

Análises

A violência contra a população LGBTI+

Por Kevin Giratto Henrique, do escritório LBS Advogados

Devido ao longo tempo de espera por uma decisão do judiciário e a argumentos ultrapassados para mascarar a violência de gênero, foi necessário criar uma lei específica para a proteção de mulheres no Brasil: a Lei Maria da Penha. Muitas mulheres trans e travestis não sabem, mas também são protegidas pela legislação. A Lei cria mecanismos para defesa do gênero feminino, devendo alcançar, portanto, também toda e qualquer pessoa que se identifique como mulher. Dados alarmantes de violência de gênero escancaram a necessidade de que a sociedade conheça a realidade e lute pela efetivação, no mínimo, do direito de viver. Continue lendo.

Aplicação da Selic pela Justiça do Trabalho dá continuidade a imbróglio jurídico

Por Cristina Stamato, do escritório Stamato, Saboya & Rocha Advogados Associados, e Nasser Ahmad Allan, do escritório Gonçalves, Auache, Salvador, Allan & Mendonça Advocacia

O uso da Taxa Referencial Diária (TRD) como índice de correção monetária no pagamento de precatórios trabalhistas já é motivo para polêmica há anos e segue longe de ser resolvida. A TRD é inferior à própria taxa de inflação, o que traria prejuízo aos possíveis beneficiários. A decisão do ministro Gilmar Mendes de dividir o pagamento em fase pré processual, usando como referencial o IPCA-E com juros contados com a TRD, e fase processual, com base na taxa Selic, em vez de resolver a situação, teria criado mais dúvidas ao não definir se a Selic seria usada de forma simples ou composta. Continue lendo.

Antes de sair…

Eventos

  • Amanhã, 7/7, às 18h, o webinar “Quem controla a água?” vai debater a crise energética e gestão de recursos hídricos. É preciso realizar inscrição.
  • A UFMG promove todas as quartas-feiras até 1º de setembro, sempre às 17h, encontros online da Escola de Inverno – Educação em Direitos Humanos. As aulas são transmitidas pelo YouTube.
  • Na quinta, 8/7, às 19h, tem mais uma edição dos Encontros de História, Teoria e Crítica da Arte, que vai discutir a presença negra na escrita da história da arte no Brasil, com interpretação simultânea de Libras.

Dicas culturais

  • Festa julina: hoje, 6/7, às 19h, o “Arraiá Virtuá” do Ifap tem música, concurso de miss caipira, barraca do beijo virtual e correio elegante, além de compartilhar fotos e vídeos dos participantes.
    Música: André Abujamra lança EP com versões de Gilberto Gil, Chico Cesar e Itamar Assumpção.
    Música 2: estreia hoje nas plataformas de streaming a coletânea Diamantes Verdadeiros Vol.II – With a Little Help From Our Friends, que celebra os 30 anos de estrada da banda Acústicos & Valvulados.
    Literatura: o livro “João Rosa Júnior: poeta d’alma”, disponível de graça para download, apresenta sonetos do maestro negro, vida e obra, e os quatro livros do autor, além de 26 poesias dispersas publicadas em jornais entre 1930 a 1932.

Plataforma digital ajuda pessoas em situação de rua a conseguirem emprego

Se para quem tem endereço fixo já anda difícil conseguir emprego, imagine para quem vive nas ruas e não tem um CEP para chamar de seu. Foi pensando nessas pessoas que a plataforma digital Trampolink foi criada. Ela apresenta perfis de moradores de rua que buscam emprego: traz foto, histórico, currículo e competências de candidatas e candidatos que estão desabrigadas.

Atualmente, 19 perfis estão cadastrados na plataforma em busca de uma vaga. Daqueles que já passaram pelo projeto, 74% foram contratados e 50% seguem trabalhando.

Além de divulgar os pretendentes e suas habilidades, fazendo a ponte com empregadores, a Trampolink também ajuda os moradores de rua a conseguirem trabalhos temporários, enquanto o emprego fixo não chega. A plataforma conta ainda com um financiamento coletivo que ajuda na aquisição de kits de higiene, material de escritório, equipamentos, roupas e uniformes, entre outros que fazem parte dos custos para manutenção da dignidade dos participantes do projeto.

Arquivos mostram envolvimento direto de Bolsonaro com esquema de ‘rachadinhas’ quando deputado

De acordo com gravações inéditas, Jair Bolsonaro (sem partido) estaria envolvido em um esquema de ‘rachadinhas’ de salários de assessores enquanto era deputado federal (entre 1991 e 2018). ‘Rachadinha’ é o nome usado para o crime de peculato (mau uso do dinheiro público).

Bolsonaro demitiu o ex-cunhado André Siqueira Valle do cargo de assessor por não entregar a parte do salário. Andréa Siqueira Valle, irmã de André, afirma que o assessor “deu problema” porque ele não devolvia o dinheiro “combinado”. “Se tinha que devolver 6.000, ele devolvia 2.000 ou 3.000, então, Jair disse ‘chega’.”

A família Bolsonaro já nomeou mais de 18 parentes e as nomeações são alvo de investigações de um suposto esquema de rachadinhas e funcionários fantasmas que chegam no valor de 90% dos salários dos nomeados.

Fonte: Folha de S. Paulo e Carta Capital  

Aplicação da Selic pela Justiça do Trabalho dá continuidade a imbróglio jurídico

O Supremo Tribunal Federal julgou no final de 2020 a ação declaratória de constitucionalidade ajuizada por entidades do sistema financeiro para tentar manter a Taxa Referencial Diária (TRD) como critério de correção monetária na Justiça do Trabalho.

O imbróglio jurídico envolvendo o tema teve início com o reconhecimento do STF da inconstitucionalidade da aplicação da TRD sobre os créditos dos precatórios devidos por União, estados e municípios. A fundamentação jurídica foi embasada em uma questão econômica: a TRD não recompõe os valores devidos, pois seus índices de atualização são inferiores aos inflacionários, logo, utilizá-la importaria em prejuízo financeiro ao credor, com violação ao direito de propriedade e à coisa julgada produzida na ação judicial.

O resultado do julgamento do STF sobre essa matéria respaldou ao órgão pleno do Tribunal Superior do Trabalho (TST) a também declarar, por consequência, a inconstitucionalidade da TRD como fator de correção dos créditos trabalhistas. No entanto, inicialmente, com modulação, somente para os créditos posteriores a 25/3/2015, aos quais deveriam ser adotados os índices do IPCA-E. Para o período anterior, preservava-se a TRD.

Em agosto de 2020, o TST alterou o entendimento em relação à modulação dos efeitos jurídicos da inconstitucionalidade declarada. Passou a determinar a adoção do IPCA-E, como critério para correção monetária, aos créditos trabalhistas a partir de junho de 2009, mantendo-se a TRD ao período anterior.

Em que pese a modificação de entendimento, quando o ministro Gilmar Mendes apresentou seu voto na ADC 58, a inconstitucionalidade da aplicação da TRD para correção dos créditos trabalhistas já era matéria consolidada na Justiça do Trabalho, assim como a adoção do IPCA-E como índice substitutivo. A controvérsia existente pairava no marco inicial da modulação, se junho de 2009 ou 25/3/2015.

O Supremo Tribunal Federal pretendeu encerrar a discussão com o julgamento da ADC 58. Mas a decisão suscitou dúvidas, tanto assim que há três embargos de declaração opostos sobre o tema, uma vez que, na espinha dorsal do voto, houve alteração do critério de correção monetária dos débitos trabalhistas, principalmente a retirada de juros de 1% ao mês devidos a partir do ajuizamento da demanda, nos termos do artigo 883 da CLT, o que nem sequer se encontrava em discussão.  

Com voto condutor do ministro Gilmar Mendes, o Supremo Tribunal Federal dividiu o processo em duas fases: a) pré-judicial, assim consideradas as verbas devidas até o ajuizamento; b) judicial, assim consideradas após o ajuizamento.

Para a fase pré-judicial, o STF determinou a aplicação do IPCA-E como índice de correção monetária e mais juros definidos no artigo 39, caput, da Lei 8.177/91, qual seja a TRD acumulada no período compreendido entre a data do vencimento da obrigação e o seu efetivo pagamento. Enquanto o artigo 833 da CLT previa a aplicação dos juros de 1% ao mês, a partir do ajuizamento da demanda, a decisão do STF determina a aplicação da TR como juros a partir da data do vencimento da obrigação. Embora o acórdão tenha autorizado a aplicação da TRD até a data do efetivo pagamento, na prática isso significa um computo de juros até 2017, vez que a TR a partir de então está zerada.

A cumulação de dois índices IPCA e TR no período pré-judicial foi uma surpresa para a comunidade jurídica, já que estes sempre foram utilizados como indexadores de correção monetária. No entanto, o ministro Gilmar Mendes em seu voto menciona a dúplice função da TR: ora usada como indexador de atualização monetária, ora usada como taxa de juros.

Para a fase judicial, o Supremo determinou a aplicação da Selic, na sua dúplice função: índice de correção monetária e juros. Com isso, a partir do julgamento do STF, os juros de 1% ao mês após o ajuizamento da demanda deixariam de existir.

Aquilo que deveria apaziguar as discussões está longe do fim. Isso porque, ao determinar a aplicação da Selic, o acórdão não define qual taxa Selic deve ser utilizada. Explicamos: ao se mencionar “Selic acumulada”, falta dizer se ela será acumulada de forma simples (somando os índices, como é o caso da tabela da Receita Federal) ou de forma composta (multiplicando-se os índices, como é o caso da calculadora do Banco Central).

Parece evidente que, ao instituir a Selic como índice duplo (correção monetária e juros), de forma a elidir a aplicação dos juros de 1% ao mês, o Supremo Tribunal Federal adotou a Selic acumulada composta, já que somente esta mostra-se hábil a contemplar a correção monetária mais juros.

No entanto, como a parte dispositiva do acórdão menciona a “Selic (artigo 406 do CC)” e este trata dos juros moratórios para pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional, o Tribunal Superior do Trabalho e os tribunais regionais estão utilizando a Selic acumulada simples, sendo que esta não contempla a dúplice função. Ao utilizar a Selic acumulada de forma simples, a tabela dos tribunais não considera no período judicial o cômputo dos juros, reduzindo o crédito do trabalhador e violando o seu direito de propriedade.

A decisão do STF para normatizar o índice na Justiça trabalhista provocou novas dúvidas e prejuízo ao trabalhador.

Texto publicado no Conjur

Por: Cristina Stamato (advogada trabalhista e sócia do Stamato, Saboya & Rocha Advogados Associados) e Nasser Ahmad Allan (é advogado trabalhista e sócio do Gonçalves, Auache, Salvador, Allan & Mendonça Advocacia).